segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

A ESQUERDA NÃO É MAIS “AQUELA”?

Agindo de má-fé na discussão da concessão de asilo político ao italiano Cesare Battisti, os “patifes ilustres” da imprensa (da Rede Globo à Bandeirantes e à Record, dos serventes globais a Mino Carta e Joelmir Betting) vão explicitando o que subentendem por “nossos fundamentos de civilização”, “os direitos humanos”, o “Estado democrático e social de direito”, “nossos compromissos com o direito internacional”, etc. -- desta feita, ecoando a destempo a “giurisprudenza politice consensuale” de Giulio Andreotti-Enrico Berlinguer-Aldo Moro-Francesco Cossiga (a “sinistra” democracia cristã-comunista) e como porta-vozes cosmopolitas da página negra dessa entente mafiosa que governou a Itália dos anos 70 a 80 e depois envergonhou com remorsos civis ao senador vitalício Francesco Cossiga e a Giulio Andreotti, tradicional primeiro-ministro do período. Assim, compungidos revivemos a conspiração institucional e os infames processos dos expurgos de insubordinados políticos.
“Má-fé” porque, se “é obrigação de governo proteger a livre produtividade da sociedade e a segurança dos indivíduos” (quando menos em sua privacidade), refundir e mistificar esses balizamentos constitucionais e programáticos com torsão de suas perspectivas é imposição-coerção abusiva. Porque o sistema produtivo deverá ter garantias de governo, embora ele não seja “o governo”; e a razão primeira dessas garantias -- as pessoas em comunidade, os produtores diretos e a sua cidadania rasa -- foram elas desrespeitadas pela aristocracia política e então afrontadas pela “macchia” Aldo Moro-Enrico Berlinguer. E Razão de Estado, ontem e hoje, na Itália como no Brasil; é sustentar e prover a vida nacional e o trabalho que a alimenta, privilegiando os seus agentes sociais. Não a CIA.
Ora, o Estado capitalista italiano do Pós-Guerra -- na reorganização de direitos políticos a instâncias públicas e individuais e aos agrupamentos econômico-políticos como reconstrutores absolutos da vida econômica e “social pós-fascista” -- designou a tutoria democrata-cristã‑comunista para fazer uma depuração ideológico-política peninsular a serviço da OTAN-CIA e de seu controle sociopolítico. Ao farisaísmo da corrupção política e das fraudes econômicas (inclusive com o Banco do Vaticano) da democracia-cristã somou-se o oportunismo e a corrupção econômico-política do Partido Comunista Italiano. Todo aquele governo (incluído o Partido Socialista de Bertini) foi complacente com os negócios de Estado transformados em negócios no Estado por essa “entente cordiale” “però democratica”. Estado de direito democrático sim, porém nele o “Estado social” subsumido por um jurisdicismo totalitarista ao modelo opereta-mussolinesca e autoritarismo legalista conformes com os “interessi personali che si nascondono sotto il manto della politica” e com seus monopólios associados; a que todos deveriam curvar-se. Porém nem todos aceitaram.
Agora, os Piero Fasino, Giorgio Napolitano, Wálter Maiérovitch, Mino Carta e outros ideólogos-democratas de ofício pretendem refazer a história e a política italiana do “grande acordo antinacional” e dos movimentos que resistiram à violência de Estado mafioso.
Para esses surfistas políticos e sábios de nomeação, os “procedimentos democráticos” convencionados não são modelos para ação e conduta e sim embustes como substância política da vida democrática. Não por outra razão lhes devemos pespegar a qualificação “patifes Ilustres”, com que o filósofo David Hume acusou os poderosos (e seus êmulos) de fazer das formas e aparências constitucionais, legais, contratuais o pretexto para agir conforme seus baixos interesses de classe e poder; ou de discernir e esclarecer de acordo com sua estupidez preconceituosa senão sua cúpida pecúnia. Pelas idéias idiossantas dessa mercenária comunicação social, o Estado tem e manterá o poder de estabular as classes sociais. (Muito antes do PPS, o PCI já negociava cargos, funções e dividendos em negócios de poder; bem como habitualmente já o faziam o Vaticano e a democracia cristã.)
As revoltas políticas e anti-autoritárias (1954, 1968 a 1974) na Hungria, França, Alemanha, Itália, Tchecoslováquia, Bélgica, Hungria, Polônia, Estados Unidos, México, Brasil e outras demonstraram os limites desse “poder democrático autolegitimado” e “politicamente consolidado” como democracia “atenta e aberta”; ou da sua contrafação na Europa do Leste, no Brasil, México, Argentina, Chile e alhures.
Sobre os conceitos: Um dia Norberto Bobbio saiu a campo e logrou destrinçar o tal “imbroglio” de jornalistas, políticos, cientistas políticos, sociólogos e intelectuais de juízo, a respeito de “posições políticas de esquerda e de direita” nos fatos e nos votos, no discurso e nas instituições. Historiando o conceito e sua aplicação, NB simplesmente apontou “quem sentava à esquerda em legítima representação do povo”; e “quem, tendo excesso de estima, apreços à nobre estirpe, privatizações com auto-agregação de valores, domínio político com ócios e negócios conspícuos e secretos, sentava à direita.” Nós, pobres opiniáticos, de pé...
Hoje há ainda políticos comprometidos com os produtores-diretos, com os profissionais técnicos e cientistas, com os “sem” (terra, teto, emprego, organização) e com a sua própria nacionalidade, que continuam postados à esquerda, lutando. Embora certas figuras sinistras de “pós-modernidade” e de sua “pós-responsabilidade social” se exponham à direita como “patifes ilustres” em nossa “sociedade política”.
Podemos ficar assim: os democratas, o MST e todos os sem-direitos agradecem esses arreganhos ao direito de sobrevida, à luta cruenta e ao voto-referendo na construção do País.

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