quarta-feira, 30 de julho de 2008

LOBOS SOLTOS NO REDIL

A insegurança social (como categoria genérica) é o grande fulcro desta sociedade opressiva, exploradora e tumultuária ‑ em que a violência da hierarquização de classes assusta ao mesmo tempo que desorienta as classes trabalhadoras, principalmente. Tematicamente; 1) o emprego e a segurança no trabalho-emprego, 2) o transporte com seu deslocamento vital, 3) a saúde e a segurança societária, 4) a incolumidade pessoal e familiar ante a incapacidade da segurança pública, 5) a educação formal X mentira institucionalizada, 6) a convivência civilizada e seu lazer-cultura, e tantos mais... Todavia você jamais conseguiu, muito menos agora no cruzamento da ignorância com a indiferença (ou simplesmente alienação pessoal e social), explicar para essa turba em pânico cultural-mitopolítico que a sua vida está colocada em jogo! O apedeuta não sabe, o burro não entende e o alegre cretino está à procura de muitas espertezas.
Mas não adianta lamentar. Escolha prioridades e concentre seus esforços nelas: por exemplo, do Atuba ao Pinheirinho (com possibilidade de atrair passageiros de Colombo‑Rio Branco do Sul‑Almirante Tamandaré‑Campo Magro, Atuba e Pinhais), por o ônibus elétrico (ou trem), trafegando por uma das pistas da ex-BR urbana, desafogaria um terço do transporte dos passageiros para a Cidade Industrial‑Pinheirinho (com extensões para Vila Fany-Vila Hauer-Boqueirão-São José dos Pinhais, até a Fazenda Rio Grande) -- embora saibamos que os negociantes da URBS, do IPPUC e da Prefeitura, como tantos vereadores, são despachantes dos negócios “municipais” e comissionados pelas empresas de transporte coletivo; e isso é tão evidente que uma parceria COPEL-Prefeitura começaria a desatar esse gargalo dos transportes coletivos! E quem é que tem a coragem de atacar esses políticos corruptos?
Todas as questões urbanas e sociais não resolvidas ou desorientadas seriam temas da campanha eleitoral (dessa única eleição programática, direta, distrital e parlamentar ao alcance do sacudir o rabo às moscas). Porém, por ser uma eleição própria de pleito distrital, no confronto direto eleitor próximo a seu representante, revela a terrível dependência pessoal e dos grupos de idéias nessa incomunicação social (desta sociedade alienante) em que vivemos, com a falta de organização político-ideológica e de seu agir-comunicativo (vide Jürgen Habermas) para expor e aglutinar interesses sociais durante os processos censitários.
O postulante a representar tantos interesses difusos (armadilha dessa genérica representação-democrática parlamentar) deverá contar com uma representatividade preliminar comunitária (profissional, sindical, de ação social; de eleitorado afeito a seu agir comunicativo), mas já com identificado prestígio ao iniciar sua pregação aglutinadora de votos. Para, a partir dos 2-3 mil votos (?) mínimos, ir expandindo organizada e sistematicamente sua sedutora postulação política.
Assim, o troleybus; o padrão-máximo de 25 alunos por sala de aula com conselho de orientação pedagógica incluído de pais; o comunitário condomínio de segurança pública; o apoio comunitário de atendimento da saúde; a definição de espaço e co-gestão popular de lazer-cultura; as associações de moradores e os sindicatos profissionais para obrigatórias decisões urbano-legislativas são algumas propostas de administração democrático-social das cidades. Mas vá dizer isso pra asno-ideólogo!

VIVA CHE

Por sierras y cañadas me fui lejanos,
tramontano, em distintos cerrados;
por breñas y cerritos convoqué meus paisanos,
de combate formei livres soldados. (bis)
Já fui muito longe
às fímbrias do horizonte,
me engalanava el exército
de ambular despacito e enérgico.
Pero, lastimava-me ser capaz,
procurando no ademais
o que vos dá sentido
e engrandece... o coletivo.
(Por sierras y cañadas me fui a lejanos...) bis
Já me passei muito longe
em aquelas montanhas detrás:
carabina uns, outros alfange
sob metralha mortera, rapaz.
De isso me nomearam herói:
por amplas jornadas a cabo
que só ao coletivo sói...
ir oscilando entre fumo,
ondeando-me como num lago,
ao dever de seu resumo.
(Por sierras y cañadas me fui a lejanos...) bis
Sabíamos da morte espreita
com cerco tenaz de opressão,
entretanto a vida aproveita
nesse combate a golpes de mão:
... a ceifa afinal é colheita,
e para nós, revolução.
Vivam as sierras de América
pois em vida nossa razão,
com fuzil e machete ao braço
a liberdade se abre no espaço.
Fui tão longe como podia...
por isso lhes dei minha vida.

HOMENAGEM À CORRUPÇÃO

Se alguém souber me diga: quem fez de Anibal Cury o modelo ético-político do Paraná?
Grileiro de terras dos índios, inventor de parte significativa das rabulices decisórias da Justiça paranaense, co-autor de aprovações indecentes no TC, legislador de quase todas as ilegitimidades de privatizações ‑ da localização de cartórios à lotação de delegados, do pedágio aos bingos, das concorrências ao fornecimentos para obras públicas; e o mais capital, até decisor nos financiamentos do BANESTADO ‑ que seus cúmplices e sócios de todos os partidos (inclusive cavaleiros, escudeiros e petistas) fizeram questão de incinerar as contas ‑. Eis “o homem público” homenageado agora com um Parque Ecológico em Almirante Tamandaré; levantado do chão e seu declínio, como um deboche público nessa afronta de seus epígonos, negociantes do Erário e caudilhetes políticos, coroados e floreados ora como epífetos ora exalando as “honrarias” por estranha osmose.
Sabemos que os discípulos do político, que por 40 anos construiu uma rede de influência e corrupção no Estado, estão ainda presentes em orientação e direcionamento da Assembléia Legislativa do Paraná e que o Ministério Público Federal tenta levantar às mãos de quem ficaram seus despojos. No Tribunal de Justiça, no de Contas e no Poder Executivo permanecem feitos e desfeitos pelo esquema da degenerescência de que ele foi o maior líder, onde a mão da lei exata não chega.
Os agentes sociais de nossa sociedade tendem à indiferença senão à leniência com esse tipo de criminoso político e seus herdeiros. Enquanto esta sociedade não for passada a limpo pela história e bacharéis e escribas continuarem a exaltar-lhes o poder, Anibal Cury, Haroldo Leon Peres, Jaime Lerner e seus discípulos continuarão renascendo a cada eleição, e o pior, com herma à entrada dos poderes e placas espalhadas desde o Parque Ecológico à cabeça de nossos “estadistas”.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

SEMELHANÇA DA SEMENTE

O cotidiano político é a própria política no dia-a-dia porém que nos esconde a totalidade dos acontecimentos. E essa visão do cotidiano não consegue ultrapassar o oportunismo e seu anedotário social nesta sociedade do espetáculo; embora também seja essa vivência, simplificadora e alienante, sob interesse e proveito para algumas pessoas e suas classes sociais. Mesmo não pode ser suficiente uma leitura tática do que acontece, nos passos que se revelam; somente uma visão estratégica da política poderá evidenciar os fatos e seus desdobramentos à luz dialética de um racional discernimento político.
Como o movimento é o modo de existência da matéria, a própria vida orgânica é por ele determinada; e como a vida biológica e as ações sociais nos seus movimentos, também as políticas como as práticas são processos de ações e sentido contraditórios. Sua efetividade se expressa dialeticamente por aspectos positivos e sua negação ‑ sendo necessários ou causais, fundantes para... ou alienantes de..., oportunos, úteis ou anódinos ‑. Importam-nos considerá-los se justos, oportunos e beneficiosos, porém sob as leis do movimento dialético qual será o seu devir a partir de suas premissas. Que ‑ se não podemos antevê-las nos pormenores ‑ saberemos de seu fio condutor no processo da luta de classes pela afirmação primacial de transformações revolucionárias (e não “evolucionárias” no sentido de conservação e consolidação das estruturas de dominação capitalista-imperialista; logo de aumento na opressão e exploração das classes trabalhadoras) e se dirige-se à evolução das classes trabalhadoras, em especial, do seu cerne operário-técnico-científico.
Não aprendemos ainda a distinguir a política Vargas, fundante do liberalismo social e da nacionalidade; da política Juscelino, consolidante da democracia liberal e da abertura de fronteiras à importação imperialista. Como não discernimos a função do BNDES de hoje como instrumento de extravasão econômica brasileira na Bolívia, Equador, Uruguai e Venezuela daquela das relações com Colômbia, Chile, Peru e México (paises assumidamente “alinhados” a Washington). Porque não se trata apenas de apoiar e estimular a expansão capitalista da Camargo Correia, Odebrecht, Vale do Rio Doce e similares (a lógica do capitalismo é a expansão e acumulação, etc...) e sim do contexto econômico polarizado e das relações políticas bilaterais e seu reflexo em nossa própria economia política; pagamos, sim, um preço político-social a essa expansão monopolista.
In dies singulus (um a um, um depois do outro...) o movimento se dá, dialeticamente. E, como ressalta Paul Foulquié na “Dialética”: “Não é a predominância dos motivos econômicos na explicação da história que distingue de uma maneira decisiva o marxismo da ciência burguesa, é o ponto de vista da totalidade. A categoria da totalidade, a predominância universal do todo sobre as partes, constitui a própria essência do método que Marx retomou de Hegel, que ele transformou de maneira a fazer dele o fundamento original de uma ciência inteiramente nova...” E acrescenta Georg Lukacs: A predomimância da categoria da totalidade é o suporte do princípio revolucionário na ciência.” As conclusões serão nossas.

O TIBETE NÃO É TUDO ISSO

O Tibete não é tudo isso – SLAVOJ ZIZEK

Protestos anti-China por cometer atos de violência contra monges não levam em conta que Pequim ajudou a tirar território da miséria e da corrupção após a Segunda Guerra Mundial
Enumero, a seguir, nove pontos a serem mantidos em mente por qualquer pessoa que faça um julgamento sobre os fatos recentes no Tibete.
Poder protetor
1) Não é fato que até 1949 o Tibete era um país independente, que então foi repentinamente ocupado pela China. A história das relações entre eles é longa e complexa, e em muitos momentos a China exerceu o papel de poder protetor. O próprio termo "dalai-lama" é testemunho dessa interação: reúne o "dalai" (oceano) mongol e o "bla-ma" tibetano.
2) Antes de 1949, o Tibete não era nenhum Xangri-Lá, mas um país dotado de feudalismo extremamente rígido, miséria (a expectativa média de vida pouco passava dos 30 anos), corrupção endêmica e guerras civis (sendo que a última, entre duas facções monásticas, ocorreu em 1948, quando o Exército Vermelho já batia às portas do país).
Por temer a insatisfação social e a desintegração, a elite governante proibia o desenvolvimento de qualquer tipo de indústria, de modo que cada pedaço de metal usado tinha que ser importado da Índia.
Mas isso não impedia a elite de enviar seus filhos para estudar em escolas britânicas na Índia e transferir seus ativos financeiros a bancos britânicos, também na Índia.
3) A Revolução Cultural que devastou os mosteiros tibetanos na década de 1960 não foi simplesmente "importada" dos chineses: na época da Revolução Cultural, menos de cem guardas vermelhos foram ao Tibete, de modo que as turbas de jovens que queimaram mosteiros foram compostas quase exclusivamente de tibetanos.
4) No início dos anos 1950, começou um longo, sistemático e substancial envolvimento da CIA na incitação de distúrbios anti-China no Tibete, de modo que o receio chinês de tentativas externas de desestabilizar o Tibete não era, de modo algum, "irracional".
5) Como demonstram as imagens veiculadas pela TV, o que está acontecendo agora nas regiões tibetanas já não é mais um protesto "espiritual" pacífico de monges (como o que aconteceu em Mianmar um ano atrás), mas (também) bandos de pessoas matando imigrantes chineses comuns e incendiando suas lojas. Logo, devemos avaliar os protestos tibetanos segundo os mesmos critérios com os quais julgamos outras manifestações violentas: se tibetanos podem atacar imigrantes chineses em seu próprio país, por que os palestinos não podem fazer o mesmo com colonos israelenses na Cisjordânia?
6) É fato que a China fez grandes investimentos no desenvolvimento econômico do Tibete e em sua infra-estrutura, educação, saúde etc. Para explicar em termos simples: apesar de toda a opressão inegável, nunca, em toda sua história, os tibetanos medianos desfrutaram de um padrão de vida comparável ao que têm hoje.
7) Nos últimos anos, a China vem mudando sua estratégia no Tibete: a religião despida de política hoje é tolerada e mesmo apoiada. Mais do que na pura e simples coação militar.
Em suma, o que escondem as imagens veiculadas pela mídia de soldados e policiais chineses brutais espalhando o terror entre monges budistas é a muito mais eficaz transformação socioeconômica em estilo americano: dentro de uma ou duas décadas, os tibetanos estarão reduzidos à situação dos indígenas americanos nos EUA.
Parece que os comunistas chineses finalmente entenderam a lição: de que vale o poder opressor de polícias secretas, campos e guardas vermelhos destruindo monumentos antigos, comparado ao poder do capitalismo sem freios, quando se trata de enfraquecer todas as relações sociais tradicionais?
Ideologia "new age"
8) Uma das principais razões por que tantas pessoas no Ocidente tomam parte nos protestos contra a China é de natureza ideológica: o budismo tibetano, habilmente propagado pelo dalai-lama, é um dos pontos de referência da espiritualidade hedonista "new age", que está rapidamente se convertendo na forma predominante de ideologia nos dias atuais.
Nosso fascínio pelo Tibete o converte numa entidade mítica sobre a qual projetamos nossos sonhos. Assim, quando as pessoas lamentam a perda do autêntico modo de vida tibetano, não estão, na verdade, preocupadas com os tibetanos reais.
O que querem dos tibetanos é que sejam autenticamente espirituais por nós, em lugar de nós mesmos o sermos, para continuarmos a jogar nosso desvairado jogo consumista.
O filósofo francês Gilles Deleuze [1925-75] escreveu: "Se você está preso no sonho de outro, está perdido". Os manifestantes que protestam contra a China estão certos quando contestam o lema olímpico de Pequim, "Um mundo, um sonho", propondo em lugar disso "um mundo, muitos sonhos".
Mas eles devem tomar consciência de que estão prendendo os tibetanos em seu próprio sonho, que é apenas um entre muitos outros.
9) Para concluir, a dimensão realmente nefasta do que vem acontecendo hoje na China está em outra parte. Diante da atual explosão do capitalismo na China, os analistas freqüentemente indagam quando vai se impor a democracia política, o acompanhamento político "natural" do capitalismo.
Essa questão com freqüência assume a forma de outra pergunta: até que ponto o desenvolvimento chinês teria sido mais rápido se fosse acompanhado de democracia política? Mas será que isso é verdade?
Numa entrevista há cerca de dois anos, [o sociólogo] Ralf Dahrendorf vinculou a crescente desconfiança com que a democracia vem sendo vista nos países pós-comunistas do Leste Europeu ao fato de que, após cada mudança revolucionária, a estrada que conduz à nova prosperidade passa por um "vale de lágrimas".
Ou seja, após o colapso do socialismo não se pode passar diretamente para a abundância de uma economia de mercado bem-sucedida: o sistema socialista limitado, porém real, de bem-estar e segurança precisou ser desmontado, e esses primeiros passos são necessariamente dolorosos.
Vale de lágrimas
O mesmo se aplica à Europa Ocidental, onde a passagem do Estado de Bem-Estar Social para a nova economia global envolve renúncias dolorosas, menos segurança e menos atendimento social garantido.
Para Dahrendorf, o problema é resumido pelo fato de que essa dolorosa passagem pelo "vale de lágrimas" dura mais tempo que o período médio entre eleições (democráticas), de modo que é grande a tentação de adiar as transformações difíceis, optando por ganhos eleitorais de curto prazo. Não surpreende que os países mais bem-sucedidos do Terceiro Mundo, em termos econômicos (Taiwan, Coréia do Sul, Chile), tenham adotado a democracia plena só após um período de governo autoritário.
Esse raciocínio não seria o melhor argumento em defesa do caminho chinês em direção ao capitalismo, em oposição à via seguida pela Rússia? Seguindo o caminho percorrido pelo Chile e a Coréia do Sul, os chineses usaram o poder irrestrito do Estado autoritário para controlar os custos sociais da passagem para o capitalismo, desse modo evitando o caos.
Em suma, uma combinação esdrúxula de capitalismo e governo comunista, longe de ser uma anomalia ridícula, mostrou ser uma bênção (nem sequer) disfarçada: a China se desenvolveu na velocidade em que o fez não apesar do governo comunista autoritário, mas devido a ele.
E se aqueles que se preocupam com a falta de democracia na China estiverem na realidade preocupados com o desenvolvimento acelerado da China, que faz dela a próxima superpotência global, ameaçando a primazia do Ocidente?
Há mesmo um outro paradoxo em ação aqui: e se a prometida segunda etapa democrática que vem após o vale de lágrimas autoritário nunca chegar?
É isso, possivelmente, que é tão perturbador na China de hoje: a idéia de que seu capitalismo autoritário talvez não seja apenas um resquício de nosso passado, a repetição do processo de acúmulo capitalista que se desenrolou na Europa entre os séculos 16 e 18, mas sim um sinal do futuro.
E se "a combinação agressiva entre o chicote asiático e o mercado acionário europeu" se mostrar economicamente mais eficiente que nosso capitalismo liberal? E se ela assinalar que a democracia, tal como a conhecemos, não é mais condição e motor do desenvolvimento econômico, e sim um obstáculo a ele?
SLAVOJ ZIZEK é filósofo esloveno e autor de "Um Mapa da Ideologia" (Contraponto). Ele escreve na seção "Autores", do Mais! . Tradução de Clara Allain

quarta-feira, 23 de julho de 2008

DIREITO E MORTE COMO ESTATÍSTICAS

1) Quando um imbecil fala em despreparo da polícia porque ela ataca, persegue, seqüestra ou mata cidadãos que deveria proteger e defender, ele está escondendo alguma coisa. Não creia que apenas esconde que é um imbecil; ele sabe que o eufemismo despreparo não mexe em vespeiro, não atrita suas relações de comissário político com a classe social de poder. Imaginou se ele esclarecesse que são as políticas de segurança do poder (sempre políticas sociais!) que levam à insegurança da população (mas afetando especialmente quem não é bem: não mora bem, não veste bem, não se relaciona bem, mas está bem ali no foco do perigo) e levam ao confronto “da lei e da ordem” com os “fora da segurança legal”, do “agente institucional da sociedade política”, com os “marginais à hierarquia social reconhecida”?
A violência policial seria assim tão-somente uma perversão do que cientistas sociais delirantes exigem como “império da lei” (i.e., do mercado de capitais?); como um remate da própria democracia política liberal em consagração do Estado econômico monopolista gestado na ditadura de 1964-88. Os filhotes de Golbery do Couto e Silva e de Roberto Campos querem finalizar sua obra com tal Estado democrático de direito, tolerância zero.
Todos seriam “iguais perante a lei”: Daniel Dantas, Eduardo Azeredo, Celso Pitta, Paulo Maluf, Sérgio Cabral, Gilmar Mendes, eu e as pessoas que foram mortas ou sendo presas e moram em condições suspeitas. Mesmo que as rendas é que conformem a cidadania.
2) De outra parte, bastou um mês da “lei seca no tráfego” e os sociólogos em trânsito concluíram que os acidentes e seu atendimento médico baixaram em “razão da tolerância zero” ante as imprudências no consumo alcoólico e abusos nos efeitos etílicos. Mas não disseram que a causa eficiente pode ser a onipresença de “blitz” policial nas ruas e não a abstenção de bebidas. Adiante, alguém poderá fazer confrontos com base científica, ou simplesmente provará que a discriminação social nessa confraria de motoristas inimputáveis, e o fato de existir mais burocrata sentado na Polícia Rodoviária do que de pé nas estradas são os fatores principais do crime e do caos nas estradas brasileiras. A que se acrescente a canalhice jurídico-política do pedágio das vias públicas por e para empresas privadas.
Quando a demagogia política e o subterfúgio do poder de classe social insistem que a “educação” deve ser vista como causa dos males civis e nacionais (sendo um efeito), não vejo indignação de partidos populares e lideranças sociais para contestar essa impostura. Entretanto, sendo evidente o fato de que as classes sociais têm poder, hierarquia, educação, cidadania e mando ou não têm poder, são subordinadas, ignorantes e iletradas, tuteladas e mandadas. Por que a violência social, os crimes dos agentes da lei, o tráfego de caminhão, ônibus, automóvel ou motocicleta nas rodovias iria mudar isso?

IMPÉRIO DA "LEI" COMO HEGEMONIA POLÍTICA

Assisti na Globo News (programa Painel, de 20/7/2008) a uma conferência do filósofo José Arthur Gianotti com os cientistas sociais Bolivar Lamounier e Luciano Dias sobre Brasil: Estado Democrático de Direito, conjuntura político-estruturante (consolidante?) e perspectivas institucionais face a ausente “projeto-função estadista” de que carecemos. Bem... Melhor dizendo, era uma apreciação do atual Estado brasileiro, uma avaliação de atitudes e condutas dos agentes públicos institucionais, em particular do atual chefe de Estado, num projeto econômico-social (e político, principalmente?) que eles vislumbram e a que esperam estejamos vinculados por força, digamos, do progresso cultural-político global. Note-se minha dificuldade em tratar o assunto, pois não sei se transcrevo fielmente o resumo, para agora adiantar a quem importe.
Fiquei impressionado não com os enormes conhecimentos teóricos expostos, principalmente ante sua práxis teórico-política de uma práxis econômico-social e em face do ainda precário contingente cultural-político que somos nós debaixo dos mais altos e decisórios agentes sociais na praça (ou nas bolsas). E particularmente quando sabemos que a economia está formada e é dirigida por interesses privados e não públicos. Entendimento para eles fácil; pra mim esforçoso.
A convergência intelectual naquele debate de alto nível tinha pressupostos da filosofia do direito e da análise genérica das sociedades contemporâneas (capitalistas, globalizadas e sumamente “ideais”) de que os três compartilham, e então eu, abismado pela grandiosidade especulativa, desejei muito entender-lhes as considerações e assertivas categóricas. Porém não me restava senão intuir que eles não tinham meus mesmos débitos com o sistema econômico-social e com esse regime político antes de avalizar e consagrar nossa sociedade nacional que mais me parece um “consenso de Brasília” ‑ em que um estadista burilado pelo mercado e com visão de Estado nacional globalizado venha a reconhecer o papel dominante das classes dominantes. E daí ouça com aguda atenção o que dizem Célio Borja, Fernando-Henrique Cardoso e, naturalmente, os três pensadores a respeito de futuro-Estado democrático de direito na esteira de algum projeto-de-Estado, que deveria ter um verdadeiro estadista na função de guia dos valores sociais, políticos, culturais e, naturalmente, econômicos.
Sei que não estou sendo precisamente fiel ao importante debate sobre o ser-nacional, suas elites e a necessidade do futuro antevisto; e assim temo ter desfigurado o que não compreendi ‑ com o risco de maldizer ou vituperar o que minha vã ciência não alcança. Talvez porque eu também não tenha claro qual seria o projeto nacional-desenvolvimentista do plano nacional do PT e do seu governo Lula, e como eles vêem a política democrático-social em curso nas relações institucionais que compartilham nessa alterosa sociedade capitalista-dependente-cosmorâmica. Ufa!
Na verdade, quem afeito assistiu à conferência-convergência dos três intelectuais e tenha horizonte cultural e social certamente além do meu há de ser tolerante com meu esforço de tentar uma síntese do ocorrido não com pretensão de invalidá-la, mas com a ânsia de encontrar ali nossos interesses de classe subalterna e nosso ansiado horizonte político. Aos cosmopolitas nada? Tudo!

domingo, 20 de julho de 2008

DISPARATES & DISLATES

A direita me vem acusando de ser complacente com o poder, conivente com o carreirismo político e tolerante com o besteirol ideológico (e eles são sinceros na medida de suas convicções); já de esquerda me acusam de ser acrimonioso com chefes e subalternos do PT e no governo federal, de até ofensivo com as cliques e claques que se formam à sombra nacionalista, socialista, comunitarista, e ser desequilibrado nas invectivas políticas (e eles podem ser sinceros). Assim, devo esclarecer a razão que têm os destros ao colocar-me do outro lado da cerca, e como os sinistros também poderiam ter alguma razão, estou tentando enfrentar a aporia respondendo ao paradoxo.
O que havia de criminoso para fazer no poder público (em qualquer dos poderes) os direitistas empedernidos e seus “patifes ilustres” já fizeram, com manigâncias e conjuras, aliciando comportamentos, conformando e fiscalizando atitudes ditas “civis”. Já à esquerda somos noviços e ultimamente desorientados; e ademais de mãos-pendentes vamos vendemos a alma ao Diabo e as idéias ao Deus-Dará, se nos colocamos na dependência daqueles que substituem os movimentos sociais em sua luta por uma sectária demagogia.
A sobrevivência nos estimula e também constringe; daí as oportunidades de vida e o dinheiro nos condicionem com incidências, muitas vezes sob total descontrole. Podemos entretanto assumir a busca de ajustar a condição e posição de classe a necessidades e valores coletivos ‑ a luta política por justiça e direitos e sua expressão em idéias e palavras ‑ ou seu reverso, no oportunismo político-ideológico e busca de vantagens, acabará criando uma retórica “fundamentalista”.
Assim é que o palavreado e o discurso podem sobrenadar a esperteza, exatamente para esconder as intenções reais e a ânsia de destaque e gratificação social: corporificam-se nos fiscais políticos e ideológicos de idéias e condutas. E como a experiência política das lutas sociais nos mostra, uns tem seu modo claro de conduta e de expressar suas idéias; já o lumpesinato intelectual quer oportunisticamente ser fiscal de idéias e exator de condutas.
Desde a Santa Ceia, quando faltou peixe na grelha e vinho nas libações e, aproveitando a boa-fé dos militantes petistas, o estamento condominiado no poder houve de negociar com Henrique Meirelles, Roberto Rodrigues e Fernando Fontana a estabilidade do sistema produtivo e suas exportações: a nação confirmou-se refém do neoliberalismo. Digo isso com a certeza de que o idiotismo faz uma cortina sobre esses fatos; e eu, ainda membro do PT, não tenho visão e compreensão zédirceista, berzoinista ou hedonista da política e sua expressão das lutas sociais no Brasil do século XXI.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

PATRIOTISMO

Se você ganha até oito salários mínimos (agravados nos últimos meses em 26%) e não tem outras fontes de salários e renda sabe que é sua a maior contribuição para o superávit primário de Henrique Meirelles‑Lula da Silva. Patrioticamente, você e não Luiz Gushiken, Ricardo Berzoíne, Martha Suplicy, Gilberto Carvalho, Hélio Costa, Gilberto Gil, Eduardo Azeredo, José Aníbal, Artur Virgílio, Roberto Rodrigues, Ronaldo Caiado ou Luiz Inácio Lula da Silva é que paga o superávit primário, o IPVA, o pedágio nas estradas e o “presságio” para a polícia nas favelas e cortiços, a transposição do São Francisco, o “reflorestamento” do Nordeste e da Amazônia; além de outras corvéias e rendas “nacionais”.
A taxa de juros regulada pela economia especulativa é o compromisso ideológico do Partido dos Trabalhadores de que o “Brasil-nós” respeitaremos os compromissos globalizados da economia capitalista, as regras internacionais de especulação da moeda, das bolsas e seu “mercado” e dos saques do capital virtual e volatizado. Quem é que criou isso? Foi o Consenso de Washington, o FMI, a OCDE, a mãe de George W. Bush e o amante da Condoleezza Rice; depois é que o Fernando-Henrique Cardoso, o Luiz Inácio e o Henrique Meirelles apuseram sua assinatura.
Todavia, não se desespere com os rumos do País, já que a “nacionalidade brasileira” está conquistando mais autodeterminação enquanto as estatísticas provam que nosso inimigo “mercado” vai incluindo muito mais pobres “betinhos” (não bentinhos). Assim, se “a nacionalidade” pertence a classe maior do que oito salários-mínimos e os “incluídos sociais” vão até um submínimo, você está no meio das estatísticas e assim continuará desguarnecido. Na verdade, você é o que podemos chamar atravancado.
Se você objetar que sua classe sócio-profissional constitui o cerne do trabalho no sistema produtivo brasileiro (seu em si‑para si); e que, além da consciência da realidade social, aporta a inteligência orgânica na idéia de nação; se você disser isso, um membro da clique econômico-dominante no regime de poder o acusará de socialista festivo ou de hermafrodita e poderá processá-lo por obsoletismo.
Pode também que algum integrante da “esquerda comissionada pelo poder” o denuncie por irregularidade ideológica e comportamento absolutamente inadequado “à dinâmica da luta de classes em nosso querido Brasil”. Bem... não há muito que fazer se você já tiver alguma idéia. De qualquer modo, você se lembra do “Comportamento Geral, do Gonzaguinha: “...Você merece, você merece! Tudo vai bem, tudo legal...”.
Quem canta seus males espanta; com ou sem superávit primário. E nós sempre podemos cantar, ou não?